terça-feira, 9 de outubro de 2007

Espécie de peça de teatro em 5 voos – 5.º voo

Qualquer coisa se passou no dia anterior porque hoje, às oito e meia, já se tratam por tu e sabem o nome um do outro. No céu estrelado dos olhos adivinha-se o sonho de cada um: no sonho dele o elevador encrava, ficam dias e noites presos no elevador que é entretanto a gruta dos ladrões, onde Ali Babá encontrara a lâmpada mágica. No sonho dela o elevador não pára de subir, sobe pelo céu como um balão, atravessa as nuvens e de repente é uma nave espacial em viagem.
Talvez ele saiba do sonho dela pois, quando o elevador chega ("plim"), ele diz: "Lá vamos nós de viagem!".
(Diz o público: "Abre-te, Sésamo" e as cortinas abrem-se.)
Ela encolhe os ombros e entra no elevador. Responde: "É uma viagem curta!" e ele encurta-a ainda mais: sai imediatamente do elevador. As portas vão-se fechando, mas ela sai a tempo. Ri o tal riso primaveril de passarinho na copa da árvore e canta: "Então!". Ele anuncia: "Sei o mapa de cor!" e ela segue-o divertida.
(Indicações cénicas: a escada de vários lances do 3.º voo aparece devagar no fundo do palco, anda sobre rodas ou emerge do chão – fica ao critério do encenador.)
Eles abrem a porta das escadas e é como se outro mundo se abrisse. Há um silêncio com eco e caminhos por descobrir. Chamam às escadas montanha e partem. Inventam histórias próprias da Disney, fazem caras assustadoras de piratas, têm vozes de monstros e imitam gritos de animais que se repetem pelas escadas. Chegam ofegantes ao 5.º andar. Ele diz: "Isto assim não custa nada!" e ela ri com dificuldade.
Olham para o céu estrelado um do outro e despedem-se cordialmente. Ela abre a porta e ele fica a vê-la. Entre um mundo e o outro, ela diz: "Não digas a ninguém onde ficam as escadas!" e agora é ele que ri. Pensa: "Fecha-te, Sésamo!" e ela larga a porta. Por causa das leis da física há uma explosão nas escadas e a porta fecha-se em queda livre.
Eles estão agora frente a frente e abrem as asas.
Quando o voo acaba, começa o beijo. Mas nós só ouvimos o eco.
Ele e ela desaparecem de cena como que por milagre e as cortinas voam.
Fim do 5.º voo. Início de tudo o resto.