Nesta noite somos enormes. Esticamos a cabeça e temos nuvens agarradas ao cabelo, damos um passo e estamos fora do mundo. Arrancas a lua do céu e ofereces-ma dizendo: "Para que não te percas nesta noite escura!". Faço um colar de meteoritos e meto a lua ao centro. És tu que prendes a fita à volta do meu pescoço (é um colar lindíssimo). Queremos ir para longe, por isso damos cinco passos e estamos em Neptuno, onde a noite é fria e azul. Falamos sobre o mar e os teus olhos são agora água, neles mergulho feita sereia. Digo: "Tenho frio" e levas-me ao colo até Vénus. Sentamo-nos de frente para o Sol e as pernas baloiçam no espaço. Chamas-me: "Princesa vermelha" e a tua boca pega fogo. Toco ao de leve na Terra e ela roda sobre si própria muito rápido. Rimo-nos do movimento e rodamo-la um pouco mais. Esticas os braços enormes e pegas em Saturno. Exclamo: "Que bonito!". Despe-lo com cuidado e pões-me o seu anel no dedo. Gritas: "O universo é nosso!", mas não temos pressa de partir. Guardamos os planetas e as pequenas luas nos bolsos e procuramos um espaço vazio. Damos cinco passos e estamos num sítio deserto. Aí ficamos muito tempo. A jogar ao berlinde à luz das estrelas.
A propósito do poema de Jorge de Sousa Braga:
"Esta noite sonhei oferecer-te o anel de Saturno.
E quase ia morrendo com o receio de que ele não te coubesse no dedo."