terça-feira, 31 de julho de 2007

A máquina de sonhos

Na casa das máquinas havia uma máquina de sonhos e o rapaz sonhava acordado com os sonhos que ela fabricava. No sábado de manhã, antes de os pais acordarem, o rapaz vestia o roupão e calçava os sapatos porque a casa das máquinas era sempre fria. A mãe tinha estendido uma esteira no chão para o rapaz não se sentar na pedra gelada e ele aí ficava toda a manhã, de pernas cruzadas sobre o tapete mágico, trabalhando na sua máquina de sonhos. O rapaz dizia à irmã "Sou cientista" e ficava horas a pensar em sonhos, a fazer medições, a colocar hipóteses. A máquina tinha vários botões: um que rodava, outro que se puxava, outro que andava para os lados, outro que tinha luzinhas e outro que era um interruptor. O rapaz explicava à irmã: "Na máquina dos sonhos escolhe-se primeiro o meio de transporte! Ou seja, tens de escolher entre o meio terrestre, marítimo, aéreo, tubular ou espacial. Depois escolhes o resto!", o que incluía a velocidade, o volume, a área, a temperatura exterior e interior, o nível de pressão sonora, de pressão atmosférica, de pressão hidrostática, de pressão arterial, entre outros. Há semanas que a irmã tentava descobrir um sonho qualquer que quisesse sonhar.
Naquela manhã, o rapaz anunciou na cozinha "Já está!" e os pais bateram palmas. A mãe disse que queria ir à Lua e o pai perguntou se podia ser o primeiro a experimentar a máquina dos sonhos. O rapaz disse que sim, agarrou-o pela mão e levou-o à casa das máquinas. Quando lá chegaram, perguntou surpreendido: "E vais assim, de pijama?". O pai encolheu os ombros despreocupado: "Mas eu não vou a lado nenhum! Quero sonhar que estou a comer uma laranja doce!". O rapaz ficou em silêncio, era um sonho francamente estúpido e tentou convencer o pai a sonhar com outra coisa (sem êxito). O filho começou então a fazer anotações no caderno, desenhou alguns esquemas, tocou na língua como quem explora, suspirou, coçou a cabeça. O pai disse: "Bem, depois chama-me para eu vir sonhar com a minha laranja". A irmã queria ficar a ver mas o rapaz expulsou-a dizendo: "Preciso de silêncio".
Horas mais tarde o rapaz chamou o pai: "Anda comer laranja!". Com grande pompa e circunstância, o rapaz abriu a porta redonda da máquina de sonhos e disse em jeito de quem ensina: "Como tudo na vida, esta máquina não faz tudo por ti. Usa a tua imaginação!".