Atenção: este blogue estreia-se finalmente nas últimas tendências do lifestyle. Espero que gostem deste espaço newly revamped, que brilha no escuro.
No comboio para Lille, folheio em alta-velocidade a revista da Eurostar, o gigante ferroviário que atravessa em regime de exclusividade o canal da Mancha e liga Londres às principais cidades dos Países Baixos, da Bélgica e da França. A revista chama-se Metropolitan, assume-se como publicação de lifestyle e é distribuída gratuitamente nos comboios que transportam mensalmente cerca de 800 mil passageiros. Na capa, a declaração de intenções: Food Culture Design & glow-in-the-dark ice-cream. A receita de sempre: futilidade ao mais baixo nível mascarada de requinte e sofisticação.
Passo os olhos pelos artigos. No início divirto-me com as expressões complicadas cheias de cores e texturas: sow cool, white hot, blue steal, cold comfort. Depois passa-me o conforto e instala-se de súbito o desconsolo da insatisfação, a angústia nervosa do consumismo.
É este o efeito das revistas lifestyle. A sensação de que algures na urban jungle há uma vida paralela muito melhor do que esta, com preocupações e necessidades muito mais refinadas. Os artigos publicitários e artificiosos vêm disfarçados de reportagens sobre as fashion boutiques e as concept stores. Gritam-me aos sentidos, dão-me ordens. Party like a Parisian, dizem-me. Grab a quick bite, smell the roses, join the locals. Don't miss. Don't let. Get ready. Pull up a deckchair. Uma pessoa apanha o comboio e sente-se logo em falta com a sua própria vida, porque não trouxe a manta de piquenique e não sabe onde ficam as culinary trends nem a vibrant nightlife. Além do modo Imperativo, os autores narram as suas descobertas fúteis quase sempre na primeira pessoa do plural. We love. We are crazy about. We kick up our heels. Nós: aquela entidade coletiva a que todos queremos pertencer, mas que ninguém sabe ao certo quem é. A experiência é comum a um grupo e, por isso, impõe-se. E é esta entidade coletiva não identificada que nos diz onde fica o buzz-worthy restaurant, onde devemos tomar um whisky-infused cocktail e onde podemos comprar statement socks, cool-kid jewellery e hipster-friendly gifts. Produtos disfarçados de conceitos. Conceitos disfarçados de coisas. Até as pessoas não são bem pessoas. São gourmet aficionados. São uma arty crowd. É difícil perceber a fronteira entre os artigos e a publicidade. Uma das secções chama-se Promotion e outra chama-se Publi-reportage. A linguagem é dazzling e cosmopolitan. Está repleta de hotspots, pit stops, pop-ups, start-ups, top-shops. Necessidades novas, soluções para problemas que desconhecíamos. Tudo isto pulverizado de vibrações e sensações. Um fresh spin, uma festive feel, uma viral sensation, um laid-back family vibe, etc.
Avanço pela revista vibrando de irritação e desânimo.
Em Amesterdão há uma professora de ioga que junta nas suas aulas uma manada de alunos e uma grupeta de cabras. A professora, inicialmente apreensiva em relação a este método, rapidamente percebeu os benefícios que resultam de abraçarmos uma cabra. Fica assim lançado o convite para hit the hay.
E tudo é cheerful, newly revamped, cosmopolitan, inspiring, outstanding, breath-taking e unforgettable.
Assim vai a sociedade ocidental. Caminhando elegantemente em sapatos de salto alto e com óculos escuros da Miu Miu para o precipício da superficialidade. Tudo going gaga com a latest craze. Cada vez mais obcecados com tendências e experiências. Todos tão sedentos de humanidade e pureza, mas cada vez mais sozinhos e infelizes. Afastados da vida, da natureza, dos outros e até de nós próprios.
No meio desta superficialidade a dar ares industrial-chic, o que importa perceber, julgo eu, é que a malta com dinheiro e poder nos media quer precisamente isso. Que nós, a entidade coletiva não identificada, continuemos a alta-velocidade, sentadinhos de preferência na classe turística, a sonhar com uma vida artificial cheia de brilhos e salamaleques, e a investir todo o nosso dinheiro e energia em coisinhas e eventos cheios de formas e sem qualquer conteúdo. Chego a Lille a sentir-me enganada e vazia de ideias.
Mas nem tudo é mau. Spice up your life, malta! Acabo de ler nesta revista que as Spice Girls poderão vir a juntar-se novamente. Zig-a-zig-ah! Eu não sou hipster-friendly nem gourmet aficionada, mas também não sou imune aos artifícios das tendências.