terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

O meu afia

O meu afia tem o parafuso no sítio e uma boca perfeita. É um afia clássico. Tem corpo de metal e faces curvilíneas para acomodar os dedos.
Por vezes, desaparece. Não o vejo durante dias. Fico desamparada.
Eu gosto de afiar lápis, de lhes torcer o pescoço. Giro o grafite e fico a assistir à queda das aparas, a ouvir o barulho do corte. É um espetáculo bonito.
Não há arte sem sacrifícios. O lápis diminui, a expectativa aumenta.
O meu afia aguça-me a mente. Fico aprimorada e pontiaguda. Até dói.
Eu digo afia-lápis. Não digo aguça nem afiador ou afiadeira. Nem apara-lápis ou apontador de lápis.
Um lápis bem afiado é uma arma. Um bom afia também.
O primeiro perfura, o segundo corta.
Afiar é um desporto de alto risco. Eu pratico e gosto.
Infelizmente, não tenho grande jeito. Arranco nacos de madeira aos meus lápis elegantes. Os bicos esmorecem e caem.
Tenho mãos grandes e uma vontade sôfrega.
O meu afia desafia.
Eu gosto disso.