quinta-feira, 24 de julho de 2008

Arroz com ervilhas

Queria, por exemplo, um homem na sua vida. Pensou nisso enquanto preparava o refogado para o arroz de ervilhas.
Estava a mexer a cebola no tacho e pensou exactamente: "Queria um homem na minha vida".
O arroz era quase sempre de ervilhas. De vez em quando fazia também arroz de tomate, mas por norma escolhia sempre as ervilhas. Isto por estas serem pequenas, redondas, fáceis, acessíveis, digeríveis. Simpatizava com as ervilhas, com a cor, o sabor e particularmente com a sua consistência. E fora justamente a propósito disso – do paladar das ervilhas – que se lembrou de certos beijos. E daí o homem. Na sua vida.
A necessidade de um homem na sua vida.
Abriu o congelador, tirou o pacote de ervilhas, entornou várias dezenas no tacho, mexeu novamente. Depois deitou a água, mais tarde o arroz. Comeu. Só isto: arroz com ervilhas. E enquanto comia elogiava por dentro a marca daquelas ervilhas, pelo facto de serem verdadeiramente rechonchudas e saborosas.
Pensou depois nas desvantagens de os homens não virem em pacotes, de não terem uma marca específica, de não virem congelados em embalagens respeitadoras do ambiente, por exemplo. Seria mais prático. Sempre que essa falta voltasse, tirava-se do congelador o dito e enfiava-se umas quantas colheres no tacho. Ao gosto de cada um. Sal, azeite e homem. Quanto baste.
Por exemplo, no seu caso, poria só um cheirinho. Para não enjoar.
Depois lavou a loiça bem-disposta. A mulher é que estava bem-disposta, não a loiça.
Nunca mais pensou em homens congelados nesse dia. Nem nos seguintes.
Uma pena.