A senhora disse que eu tinha peso a mais. 
De início indignei-me (Granda patega!), mas depois dignei-me. 
A senhora referia-se à mala de viagem, claro, claro, claro.
Tirei três livros da mala e enfiei-os no saco.
Foi suficiente: os três livros, juntinhos, pesavam dois quilos. (Ganhei!)
A senhora desejou-me boa viagem e eu encolhi a barriga.
Durante o voo, para passar o tempo e o espaço, pensei nos três livros. 
Eram literatura da pesada.
E, no entanto, quem olhasse para eles, jamais diria. 
Eram textos desocupados. Pareciam três pedaços de prosa inócua.
Um falava sobre o vazio, outro sobre a desumanização e outro sobre ninguém.
Sempre tive esta atração pelo vácuo. 
Sou oca e inconsistente. 
Pareço uma aeronave a deslizar como se fosse levezinha. 
Tenho a cabeça no ar.
(Literalmente no ar.)
Olho pela janela. 
As casinhas lá em baixo. Tão banais e desabitadas.
Está a chover em Bruxelas.
São gotas mirradas, mas fazem mossa.
Não há nada mais pesado do que o vazio.
 
