Suga sumo de laranja por uma palhinha de plástico amarela que mordisca enquanto ouve. Também ajeita os seus óculos muito grossos para se verem bem ao longe. Prefere ouvir a falar, esta moça que suga sumo de laranja. Por causa disso, faz perguntas. Muitas perguntas. Sobre isto, sobre aquilo. Sobre os outros. Sobretudo, sobre os outros. É uma vampira cusca, conheço o estilo. Posso perguntar-te uma coisa? Conheces aquela? E a outra? E aqueloutra? Faz o quê? Ai sim? É solteira? Vive onde? Também exclama, a moça, porque os outros falam mais quando exclamamos, especialmente se formos teatrais. A sério? Meu Deus, não fazia ideia! Que horror! Coitada! Um certo comprazimento preenche-lhe a voz, por causa da fofoquice e também da vitamina C. Sente-se mais forte, agora. Por causa dos outros, que se sentem visivelmente mais fracos. Suga o seu suminho de fruta, a moça, e mordisca. A vida dos outros faz-lhe bem. É como ter vida própria, mas é muito melhor do que ter vida própria, porque não é preciso ter uma opinião ou tomar uma atitude ou gastar energia com coisas mundanas, como seguir uma receita de cozinha ou lavar as janelas. É só preciso estar em companhia, num barzinho de vampiros, a beber sumo de laranja e a fazer perguntas. É uma vampira cusca, sem dúvida, conheço bem aqueles dentes compridos. Tem também a tez muito branca, porque nunca apanha sol. E, por ser eterna, não tem grandes ideias, faz perguntas. Precisa de matar o tempo em barzinhos assim. Ri-se, exclama, cada vez mais forte, os outros cada vez mais fracos. Parecem pessoas de verdade, mas não são. As vampiras cuscas são das maiores pragas nas grandes cidades. Os pombos também. Infelizmente, as pessoas continuam a dar-lhes de comer. E já se sabe que, tanto no caso das vampiras cuscas como no caso dos pombos, a capacidade de reprodução está estreitamente associada à sua alimentação. Nunca mais dou de comer a vampiras cuscas.