Um senhor sobe a rua. É um daqueles senhores repetidos que vestem fato e gravata e bebem vinho branco na Place Lux a partir das cinco e meia. O senhor repetido usa por cima da gravata o cartão de identificação do Parlamento Europeu ou da Comissão Europeia ou do Conselho da União Europeia ou de outra instituição a acabar em –eu ou –eia, com a sua fotografia e com estrelinhas, acho (não dá para ver daqui). O senhor repetido não está a beber vinho branco, está só a subir a rua. A narradora deste texto, que está aborrecida, fica a vê-lo subir. De repente, assim do nada, o senhor repetido cai, o que é muito incómodo para quem vê e para quem cai, porque o senhor é elegante e não devia ter caído. Além disso, não tinha propriamente razão para cair, porque não escorregou nem tropeçou. Ainda assim, cai. E o mais curioso é que nunca mais se levanta, porque também nunca mais aparece. O senhor, pura e simplesmente, desapareceu. Tipo Tcharam!, um truque de magia. É possível até que não tenha chegado a cair. A narradora espera, espera e nada acontece. Conclui: Só pode ter sido um qualquer truque de magia. Isso ou o senhor caiu efetivamente num buraco muito fundo, coitado. Nesse caso, talvez esteja vivo ainda e deve estar muito aflito, enfiado naquele buraco. Fica preocupada, a narradora, quer ajudar o senhor repetido. Mas eis se não quando aparece, no fundo da rua, um outro senhor repetido. Não será, com certeza, o mesmo (descubra as diferenças), mas também deve beber vinho branco na Place Lux a partir das cinco e meia. Fica a vê-lo da janela, a narradora. Infelizmente, este senhor não cai nem desaparece. Deve ser o suplente.