Digo-vos uma coisa: Não é mau ser operado ao joelho. Eu, na verdade, até gosto.
Estou em casa há seis dias e um dos momentos mais activos das minhas manhãs consiste em levantar-me da cama, ir até à sala, sentar-me no sofá e pousar a perna direita na cadeira em frente. De resto, as actividades variam consoante o dia: como bolachas, vejo televisão, leio, escrevo, como chocolates, faço Sudoku, vejo um filme, adormeço a ler ou a ver a BBC ou a fazer Sudoku. As pessoas telefonam-me, preocupadas e disponíveis (às vezes, acordam-me). Algumas trazem-me chocolates, flores, queques, livros, sopas, revistas, séries de televisão.
O homem ilimitado cuida muito, esforça-se. Lava a loiça e a roupa, telefona-me do supermercado para saber o que quero jantar, actualiza o computador e o iPad, não quer que me falte nada. Ando a ver várias séries da BBC e já escolhi os filmes que vou ver durante a semana. Na sexta acabei de ler os contos do Kazuo Ishiguro e já vou a meio do Lord of the Flies, a vida avança.
Além disso, apesar de as canadianas serem mal-jeitosas e não condizerem com as minhas saias, até gosto de as passear pela rua, porque as pessoas olham para mim com interesse e compaixão.
Bom, é evidente que nem tudo são rosas: demoro, por exemplo, 15 minutos a ir à casa de banho e só consigo levar uma coisa de cada vez para a mesa-de-jantar, o que é desagradável quando a pessoa tem fome (primeiro o prato de sopa, depois o pão, depois o queijo, depois os talheres), mas também não tenho propriamente pressa de despachar as poucas tarefas que realizo durante o dia.
Admito que também me dói o joelho mas, fora isso, a vida não é nada injusta e eu aturo muito bem esta maleita, porque gosto muito de mimos e, sinceramente, não me apetece nada trabalhar.