- Boa tarde, dá-me licença? Queria mudar aqui o soro, pode ser?
- Sim, obrigada. Entretanto já posso comer?
- Ainda não comeu nada?
- Não.
- A que horas foi a operação?
- Não sei.
- Não sabe?!
- Não. Estava a dormir, mas deve dizer na ficha.
- Mas não sabe mais ou menos quando foi?
- Não. Quer dizer, foi de manhã. Lá para as 9h30, talvez 10h.
- Mas já são 16 horas! Ainda não comeu nada hoje?
- Não.
- Nada de nada?
- Não.
- Devem-se ter esquecido, sabe?
- Esquecido?
- Pois, quando serviram o almoço já estava no quarto, não estava?
- Não sei... Posso então comer agora?
- Pois, o problema é que eu agora tenho o frigorífico vazio...
- Vazio?!
- Sim. Acha que consegue esperar até às 17h?
- Até às 17h?
- É quando eles trazem o lanche.
- O lanche?
- Sim. É mais uma horinha, está bem?
- ... Está bem.
Na televisão só passavam programas sobre gastronomia e culinária. O capítulo do livro que estava a ler falava sobre a matança do porco. Livro injusto. O lanche acabou por chegar às 17h30. Duas fatias de pão, duas fatias de queijo, um café e um pudim de baunilha. Engoli tudo de uma vez. Mais tarde, o homem ilimitado trouxe-me bolachas e eu devorei-as de madrugada. Eram boas, acho.