segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Nuvens







 - Vou fazer um bolo de mármore.

- O que é mármore?

- É uma rocha.

- Vais fazer bolo de rocha?

- Mais ou menos.


Os mais novos entusiasmam-se, querem ajudar. Pesamos a farinha e o açúcar, partimos os ovos. 


- E agora atenção -, digo-lhes eu, - as claras vão transformar-se numa nuvem.

Um deles muito atento, o outro impaciente. - Demora muito tempo, mamã.


No fim, as claras transformam-se numa nuvem. 

- Magia! 


Um deles feliz, o outro desiludido. 

- Isso não é uma nuvem, mamã. 

- Ai não? Então as nuvens não são brancas e fofinhas? 

- As nuvens não são brancas, são pretas.

O outro minorca: 

- Também podem ser brancas.

O irmão insiste: - São pretas!


Coitados dos meus filhos. Tiro uma fotografia às nuvens pretas lá fora e vou à cloud (outra nuvem!) procurar imagens de nuvens brancas. 


Nessa pesquisa encontro a tisana 87 da Ana Hatherly, que fala de “uma paisagem onde nunca havia nuvens”. 


E encontro também uma foto de um livro meu, onde me deparo novamente com esta pergunta: “Para que serve uma nuvem?”. 


Não tiro fotografias ao bolo, que desenformo e polvilho com açúcar em pó. Estava leve e fofo. Parecia uma nuvem e não uma rocha, para grande desilusão das crianças. 


A infância não acaba. Cresce. Tal como os bolos. E as nuvens. E o musgo. E as claras em castelo. E a escuridão.