Há muito tempo.
Tínhamos pernas e braços.
Os nossos pés pisavam raízes, escorregavam no musgo.
Às vezes, eu caminhava à tua frente. Outras vezes, caminhava atrás de ti.
Trazíamos paus de bambu na mão. Passávamos por baixo de troncos caídos.
Passávamos por cima de troncos caídos.
Tocávamos nas árvores e no chão, mergulhávamos os dedos na água.
Um veado olhou para mim, eu olhei para ele.
Eu e tu no cimo da montanha.
Uma floresta em cima de outra floresta.
Montanhas por cima de montanhas, árvores por cima de outras árvores.
Tu deste um grito. Eu não.
Da minha boca saíam pequenas nuvens que se juntavam às outras nuvens.
Os nossos pés sobre folhas e pinhas. Eu e tu a magoar o silêncio. As pedras diziam: Shiu, mas nós não sabíamos calar os pés.
A certa altura atravessámos uma ponte suspensa e ficámos a ouvir o rio.
Eu e tu suspensos.
Os nossos pés na floresta.
As árvores muito compridas, de tronco torcido. Raízes por cima de árvores caídas e ocas, por cima de outras raízes, por cima de pedras.
Raízes como mãos.
Árvores que carregavam outras árvores aos ombros, ramos enlaçados noutros ramos.
De repente fiquei sozinha. Eu e as pequenas nuvens que saíam da minha boca.
A floresta mexia-se nas minhas costas, as árvores rastejavam atrás de mim. Como crocodilos.
Um ramo tocou na minha nuca. Um ramo que não existia antes.
Eu chamei por ti, mas tu não ouviste.
A floresta engolia as palavras e também as pequenas nuvens que saíam da minha boca, os meus passos, os teus passos.
A floresta como um monstro.
As minhas mãos muito velhas e ásperas. Como raízes.
Eu e tu a ganhar raízes.
E éramos verdes como o musgo, frios como as rochas, longos como cedros.
Eu e tu na floresta.
Os mais antigos de todos.