Que um homem não é de ferro já todos sabiam. Mas que os soldadinhos de chumbo já não queriam ser de chumbo, não, ninguém sabia. Só eles. Aliás, os soldadinhos de chumbo tomaram esta decisão ontem à noite: já não queriam ser soldadinhos de chumbo, pronto. Informaram então o primeiro-cabo. Disseram: "Queremos ser homens de verdade". O primeiro-cabo alarmou-se e fez o que lhe competia: informou o cabo de secção. Por seu turno, o cabo de secção apressou-se escada acima para informar o segundo-sargento, que informou o primeiro-sargento do andar de cima, que informou o sargento-mor de cima, que informou o cadete, que informou o alferes, que informou o tenente, que informou o capitão, que informou o major, que informou o coronel, que informou o brigadeiro-general, que informou o tenente-general, que informou o general. E quando a informação chegou finalmente às águas-furtadas, o marechal exaltou-se, gesticulou irritado. Disse ao general que, nas forças armadas, quem dava informações era ele e não os soldadinhos de chumbo. O general informou prontamente o tenente-general e a informação desceu direitíssima até ao rés-do-chão. Por último, o primeiro-cabo informou os soldadinhos de chumbo. Disse: "Nas forças armadas, quem dá informações é o general e não os soldadinhos de chumbo". Os soldadinhos de chumbo não perceberam logo a informação. Parecia-lhes um facto evidente, estavam plenamente de acordo. Uniram, pois, os calcanhares com energia e levaram a mão direita à borda da testa, cheios de continência.
É que, entretanto, já se tinham esquecido da tal decisão.
(Eram soldadinhos de verdade.)