Come bastante. Esparguete à bolonhesa, bacalhau com grão, almôndegas da avó. Ri-se sozinho. Nem sempre explica por que razão se está a rir.
Faz planos para o futuro. Se hoje é segunda, amanhã é terça e depois é quarta. Quer saber em que dia vamos para Portugal. Digo-lhe, por exemplo: “Faltam 40 dias.” Ele diz: “Isso é muito tempo.”
Conto-lhe tudo o que vai acontecer ao longo dos 40 dias. Primeiro vamos ao cabeleireiro, depois são as férias de outono, depois é o teu aniversário, depois montamos o pinheiro de Natal e depois vamos para Portugal. Ele decora: cabeleireiro, férias, aniversário, pinheiro, Portugal.
Desenha que eu sei lá. Folhas e mais folhas. Carros, sapatos, pistas, mapas, monstros, super heróis e também este menino dentro de um coração no meio da chuva.
Diz muitas vezes: “Vou pensar”. Ou então: “Estou a pensar”. E também: “Não faz mal.”
No outro dia, ao entrar no elevador, perguntou-me: “Eu sou fofinho?” Sim, sim, és muito fofinho, disse-lhe eu. Subimos no elevador, felizes com a sua fofura.
Fala muito alto. Peço-lhe que fale mais baixo. Ele diz: “Não consigo.” Pergunta-me se quero brincar com ele. Digo-lhe muitas vezes que não posso. Vou dar banho ao mano, digo-lhe eu, ou vou fazer a sopa, ou ainda estou a trabalhar.
Por vezes lá me sento. “Vamos jogar ao jogo da glória!”, diz ele. Bora lá, então. Ele lança os dados e explica as regras, antecipa os movimentos. Diz: “Se calhas aqui, desces. Se calhas aqui, sobes.” Vai comentando o jogo. “Mamã, tiveste muita sorte.” Ou então: “Não tiveste sorte.” Quer ser ele a ganhar mas não gosta que eu perca. “Vamos ganhar os dois.”
Gosta de ir à escola. Tem uma grupeta de amigos, todos rapazes. Nasceram em Bruxelas, mas são todos estrangeiros. O pai de um deles é sírio, a mãe de um deles é alemã. Falam todos francês.
Gosta de ser o irmão mais velho. Muitas vezes é ele que põe fim às brigas dos irmãos. “Olha o meu umbigo”, diz ele. Os irmãos param de chorar, começam a rir.
No outro dia, a caminho do cabeleireiro, disse-me que não queria o cabelo muito curto. Que gostava da franja mais comprida. Explicamos o seu pedido à cabeleireira. Ficou satisfeito com o resultado.
Há umas semanas sonhou que toda a gente andava na rua de cuecas. Cada vez que fala neste sonho, farta-se de rir. Diz coisas assim: Eu vou comer 10 vezes este arroz. Eu gosto tanto de ti para sempre. Eu quero secar o cabelo todos os dias.
Faz aviões de papel. Salta à corda. Constipa-se. Arrota. Pede desculpa. Ainda não perdeu nenhum dente. Ainda me pede colo. Adormece sozinho. Distrai-se facilmente. Diz coisas que o fazem rir: pum do rabo, sanita velha, mamã cocó.
Adora pepino. Adora o Pikachu. Adora carros: carros de corrida, carros antigos, carros elétricos, telecomandados. Está a aprender a ler e a escrever. Tem uns olhos grandes, lindos, cintilantes.
É dos mais novos da turma, é o mais velho dos irmãos. Faz hoje 6 anos. Já soprou uma vela ontem, já soprou essa mesma vela de manhã. Vai soprar outra vela na escola e depois em casa outra vez e depois há de soprar na sua festa, no próximo sábado.
Isto é celebrar até cansar.
Uma salva de palmas. Uma salva de palmas. Uma salva de palmas.