Nunca pareci mais nova. Pelo contrário.
Durante a infância e a adolescência, quando revelava a minha idade, as pessoas - geralmente adultas - reagiam com surpresa ou até indignação e acrescentavam sempre: “Pareces mais velha”.
Quando tinha 10 anos, achavam que tinha 15. Quando tinha 15, achavam que tinha 20. E por aí fora até aos 30 e picos. Com o tempo, o choque foi dando lugar à aceitação, que deu lugar à absoluta indiferença.
Cheguei finalmente à minha idade: sou e pareço uma mulher com 40 anos.
No outro dia tirei esta selfie. Adoro o meu cabelo indomável. Adoro selfies ao vento.
Estou cada vez mais parecida com a minha mãe. Digo frases que ela dizia. Por exemplo: “Os meus filhos são tão lindos” e também “Vocês cansam-me”.
Começo a dar valor aos acessórios: anéis, bandoletes, écharpes. Tenho uma mochila de pele. Tenho brincos de esmalte. Tenho um marido. Temos três filhos.
Já fui mais nova. Já fui mais bonita. Já fui mais magra. Ocupo cada vez mais espaço. Acordo a meio da noite. Já não tenho medo do escuro. Já não ando sempre descalça.
Por vezes agarro num dos meus filhos e encho-o de beijos. Eles refilam, soltam-se como podem. Também ralho muito com eles. Beijar e ralhar: duas faces do mesmo amor.
Escrevo sempre que posso. Se tiver cinco minutos, escrevo cinco minutos. Se tiver quarenta, escrevo quarenta minutos. Não vou ao ginásio, não corro no parque, quase não vejo Netflix.
Leio. Beijo. Ralho. Escrevo.
Em certos domínios não deixei de ser criança. Choro por tudo e por nada. Ainda me apetece fazer o pino. Preciso de muito colo. Não sei fazer uma lista de compras. Não tenho jeito para arrumar coisas. Não sei dobrar uma manta sequer.
Custa-me cada vez mais o inverno. Custa-me viver longe dos meus pais. Preocupa-me o futuro. Mesmo assim, acho que ainda não me bateu a crise de meia idade. Pelo menos não tenho planos para mudar de vida.
Sou feliz quando bebo o café da manhã. Sou feliz quando as magnólias da rua florescem. Sou feliz quando faz sol, quando os meus filhos jantam bem e pedem mais, quando o homem da minha vida chega a casa, quando aterro em Portugal e o meu pai me tira uma foto à chegada, quando a minha mãe penteia o meu cabelo, quando me sento com uma amiga num café.
Gosto muito das minhas pessoas. Algumas dessas pessoas já morreram mas eu continuo a gostar muito delas.
No fundo, aos 40 anos, tal como aos 10 e aos 80, só isto importa: a certeza de que amamos alguém e de que somos amados.