domingo, 9 de fevereiro de 2020

Tempestade Ciara

Sigo os conselhos dos bombeiros. Fecho as janelas, tiro tudo da varanda: os vasos, a bicicleta, os sacos de lixo, a piscina insuflável que não cheguei a esvaziar.
Lá fora, o pinheiro gigante abana. As árvores lá atrás também.
O vento assobia e urra. Folhas e sacos pelo ar. Os meus filhos agitados, como se também eles estivessem para aí largados ao vento. As ruas desertas. Agora nem sequer passam carros.
Na sala, a janela treme, velha e fraca. O vidro fino e sujo. Eu gorda e frágil. Fico deste lado a ver o espetáculo.
Dentro de mim uma certa esperança.
É sempre assim. O vento atrai-me.
Na Boca do Inferno tinha medo de não resistir à ventania, de me atirar a ela num impulso de exaltação e descontrolo. E nunca tive medo do lobo mau, que manda tudo abaixo com a força de um sopro. Acho esse sopro bonito. Gostaria de levar com ele. De ir pelos ares.
A culpa deve ser do Feiticeiro de Oz. Aquele furacão espantoso que leva a menina e a casa para uma terra de fantasia.
Além disso sou do Guincho. Sou do oceano. Sou da Boca do Inferno. Sou feita de vento e rocha.
Estou aqui em frente à janela fraca. Trago calçados não os sapatos mágicos da Dorothy mas umas pantufas da Serra da Estrela. Ainda assim, tenho esperança neste vendaval. Talvez ele me leve para uma outra dimensão. Talvez seja melhor que esta.

Nunca se sabe.