terça-feira, 26 de abril de 2022

"Está a chover!" nos Hipopótamos na Lua

Olha, olha. O Gnu e o Texugo encontraram uns Hipopótamos na Lua.

Belo texto de análise da blogger, livreira e dinamizadora Nazaré de Sousa no seu blogue "Hipopótamos na Lua":

https://hipopomatosnalua.blogspot.com/2022/04/o-gnu-e-o-texugo-esta-chover.html

Copio para aqui este excerto muito vrim, vram, vrum:

"Tal como no primeiro livro, a simplicidade e o humor do texto de Pessoa voltam a encantar-nos. A dose de ingenuidade e até o seu quê de nonsense  desconcertam o leitor várias vezes. Gostamos dos vrim, vram, vrum, dos snif, snaf, snuf... Gostamos e precisamos de histórias que nos fazem rir. Só porque sim. Na esteira das anteriores, as ilustrações de Matoso são um regalo para os olhos de miúdos e graúdos. Mesmo à chuva, este é um livro que continua a poder virar-se de cabeça para baixo, permitindo ler a história ao contrário. E que história! Sic, sac, suc."





segunda-feira, 25 de abril de 2022

Porventura acaso talvez - 25 de abril sempre!

 25 de abril sempre!


"porventura acaso talvez

uma hipótese entre outras hipóteses”



no meu “Fósforo”, Flan de Tal, 2021

segunda-feira, 11 de abril de 2022

Karateca - 5a edição!

Yáááa! 5.a edição!

A karateca está de volta. O meu absolute best-seller.

Ali estou eu, rapariga karateca, e ali estão os meus cadernos, os meus sonhos, as minhas angústias e as minhas perguntas sobre o amor, o futuro e a verdade. Ali estão também os meus pais, os meus professores, o meu irmão, os amigos, os primos, os tios, os avós.

É o meu primeiro livro, o mais ingénuo, o mais Ana.

Quando acabei de o escrever, não percebi se tinha realmente acabado de o escrever. Não percebi se aquilo era um livro ou a continuação dos meus cadernos.

Com ele ganhei o Prémio Branquinho da Fonseca. Soube da notícia num dia de chuva, depois de uma consulta de ortopedia por causa de uma lesão antiga no joelho, decorrente do Karaté. Lembro-me de entrar no táxi com as minhas canadianas, de rogar pragas à chuva e ao meu joelho, de pensar “Por que raio fiz Karaté? Por que raio não fiz antes natação ou ioga?” Nem sequer era grande karateca, nunca quis participar em campeonatos, não gostava muito de me ver com o kimono de Karaté.

No dia do lançamento do livro, estava tão nervosa que não conseguia segurar no copo de água pousado à minha frente.

Uma vez perguntaram-me que livro eu escolheria salvar, se só pudesse salvar um dos meus livros. Respondi sem hesitar que salvaria a karateca. 

Foi ela que me levou ao Planeta Tangerina, onde tenho sido tão feliz na tagarelice, na labuta e na partilha com a Isabel Minhós Martins, o Bernardo P. Carvalho, a Madalena Matoso, a Yara Kono, o João Gomes de Abreu, a Joana Estrela, a Cristina Lopes, a Carolina Cordeiro, a Mariana Vale e todos os demais habitantes desse astro.

“Eu não sou menina. Nem romântica.”

É que não sou mesmo. 

Topa-se, né?

terça-feira, 5 de abril de 2022

Penico e Putin

No final de fevereiro, enquanto a Rússia invadia a Ucrânia, eu lia um livro de 300 páginas sobre desfralde. As almas menos sensíveis poderão acusar-me de ser uma mãe desfasada das tendências do mundo, mas qualquer observador mais atento perceberá certamente que, às portas da guerra, uma mãe deve preparar os filhos para o autocontrolo e a dignidade, começando desde logo pelo domínio das fezes.

Em tempos de guerra, será ainda mais urgente, mais económico, mais ecológico, mais seguro e mais saudável os mais pequenos aprenderem a evacuar adequadamente.

E portanto, é como vos digo: a Rússia invadiu a Ucrânia - tanques, aeronaves, mísseis, vítimas mortais, refugiados - e eu lancei os meus filhos para esse estranho encontro com o seu próprio corpo. Ali estão eles, expostos, desarmados, como vieram ao mundo. Observam-me confusos talvez, ainda mais sós, ainda mais gémeos, ainda mais nus e indefesos. 

É preciso olhar para a existência humana através dos seus olhos. Na perspetiva dos meus filhos, largar as fraldas é como ir para o Espaço, como ir para a guerra, tudo é novo e assustador a partir do momento em que andam nus pela casa, à mercê da sua vontade urinária e fecal.

No tal livro de 300 páginas sobre este assunto, a autora americana, perita em desfralde, lembra-me que esta aprendizagem só vai ser prioritária para os meus filhos se ela for prioritária para mim. Ao longo da próxima semana, diz-me ela, não pensarei em mais nada além deste confronto com o bacio. Aceito o desafio e vou para a guerra. 

Passam-se dois ou três dias em que as fezes raramente vão parar ao penico. Limpamos o chão demasiadas vezes. Muito chichi, muito cocó, muitos escombros, muita frustração para os pais, para a ama e para os dois pequenos soldados.

Recordo os ensinamentos da perita americana: importa não perder a paciência e não entrar em contendas de poder. Firmeza, mas não dureza. Esta é, afinal de contas, a primeira vez que uma criança aprende a dominar o corpo. Convém que a experiência, apesar de exigir concentração e esforço, dê um resultado positivo.

Aprendemos por repetição, por mimese, por insistência e persistência. Se tudo correr bem, daqui a poucos dias a criança vai conseguir interpretar os impulsos musculares da bexiga e dos intestinos, e tomar a iniciativa de se sentar no penico. Essa será a sua primeira experiência de sucesso. E muito em breve será precisamente a mestria do penico que estará na base da sua auto-estima na sua relação com o seu corpo.

Penso em Vladimir Putin. Pergunto-me se tudo poderá ter corrido mal desde esta travessia de autoconhecimento, se Putin terá largado as fraldas num ambiente de segurança, se terá sido amado, abusado ou humilhado durante esta aprendizagem. Se um opressor pode começar aqui mesmo, numa criança oprimida sentada num penico.

Penso em todos os soldados atirados para a guerra, os russos, os ucranianos e os demais que se lhes juntaram, todos eles filhos de mães que lhes ensinaram a utilizar o bacio, a bem da sua autonomia e do seu bem-estar. Aqui estamos todos, pais e filhos, opressores e oprimidos, e basta uma criança sentada num penico para percebermos que o nosso caminho poderia ter sido tão diferente, a mãe a bater palmas, emocionada com a conquista do filho.

Um dos meus rapazes chora porque fez chichi nas calças. Vacilo entre a frustração e o amor. Ralho e refilo, cansada e, ao mesmo tempo, receosa de que ele venha um dia a perder o ânimo por minha causa, de que venha a invadir um país.

Se eles falharem, a culpa será sempre minha, claro, que ralhei com eles no momento em que precisavam de um abraço. Penso em Vladimir Putin e imagino-o assim, aos dois anos e meio, vulnerável, as calças molhadas com a sua própria urina e não posso deixar de sentir o peso da minha responsabilidade. 

Já sei que a tendência agora é não pressionar, é nunca dar um feedback negativo, é não fazer desfralde sequer, é esperar que as crianças decidam sozinhas que querem aderir às normas sanitárias de evacuação. De facto nada é mais pessoal e visceral do que as nossas próprias tripas.

Por outro lado, nada é mais ideológico do que educar, ensinar, formar. Estado e indivíduo parecem estar incompatibilizados. No que toca aos mais pequenos, a escola espera que as crianças saibam evacuar aos 3 anos, que aprendam a ler aos 6, que aprendam inglês aos 10, que entrem na universidade aos 18. A vida não está fácil para os que querem esperar até estarem preparados. 

Parto, pois, do princípio de que nunca ninguém está preparado para nada e nunca ninguém ficará à espera de que estejamos finalmente à altura do que quer que seja. Tudo será sempre imprevisível e excessivo e vai exigir esforço, adaptação, diálogo e aprendizagem.

Isto aplica-se à maternidade, à escola, à geopolítica, às operações militares, à cerimónia dos Óscares e também à arte de urinar e defecar.