sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Um monstro sem pés nem cabeça

Era uma vez um monstro sem pés nem cabeça. Tinha um tronco, dois braços e duas pernas e andava pela rua com uma mão à frente e outra atrás. Como não via por onde ia, dava sempre com o nariz na porta. Diziam que andava com a cabeça nas nuvens, mas isso não era verdade. O monstro não tinha cabeça. Como também não tinha boca, nunca dava com a língua nos dentes, por isso todos lhe contavam os seus segredos. Quando lhe faziam uma pergunta, metia os pés pelas mãos, embora não tivesse pés. Perguntavam-lhe: "Um gato comeu-te a língua?", mas ele fazia ouvidos moucos porque, de facto, não ouvia. O monstro também metia o rabo entre as pernas e estava sempre de mãos a abanar. E não sentia apetite, porque não tinha água na boca. Crescia como as plantas, mas não estava agarrado à terra. Era um animal vegetal. Fazia tudo de olhos fechados e nunca dava o braço a torcer. Uma mão lava a outra, dizia ele sem falar. E sempre havia quem lhe desse uma mãozinha. A verdade é que ninguém lhe pisava os calcanhares nem lhe arrancava cabelos. Todos tinham medo dele, embora o monstro estivesse de mãos atadas. Tinha um aperto no coração e dor de cotovelo. Felizmente, não tinha dor de corno, já que não tinha cabeça nem namorada. Estava sempre com o pé atrás da porta e com a pulga atrás da orelha, embora não tivesse pés nem orelhas. O monstro tinha um segredo muito bem guardado e não ia abrir mão dele. Se os homens descobrissem que não tinha pés nem cabeça, perdiam-lhe logo o medo e o respeito. O monstro tinha a corda ao pescoço. Mas, graças ao medo dos outros, tinha a faca e o queijo na mão.