segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Western revisited: Eleições no Far West

Um índio candidatou-se a xerife. Era a primeira vez que tal sucedia no Far West. Esse índio chamava-se Jlin-Litzoque (Cavalo Amarelo) e pescava no rio com uma lança. Também lia o futuro no movimento da água e falava com a lua.
No bar do Joe, todos à excepção das mulheres discutiam as eleições, os direitos dos índios, o futuro da América.
Como previsto, e para grande alívio dos vaqueiros, o rancheiro Rowdy Yates também se candidatara. Era respeitado na povoação e sabia manter a ordem, a julgar pelas suas vacas disciplinadas. Tinha uma mulher e três filhos, sabia ler e escrever.
Os índios não votavam, pelo que a vitória de Rowdy Yates era provável. A contagem de votos terminou na segunda-feira e o xerife cessante anunciou o vencedor no bar do Joe, onde os homens passaram a noite a beber, a comer, a dançar e a copular com mulheres que não as suas. O xerife anunciou, sem surpresas: Rowdy Yates era o vencedor, tendo os homens continuado a festa. O novo xerife subiu para o balcão a custo e recebeu a sua estrela.
Nisto entra no bar do Joe o Cavalo Amarelo. (Os índios nunca entravam no bar do Joe.) Todos os homens se calaram, estupefactos, excepto Rowdy Yates, que lhe perguntou destemido:
- Vens felicitar-me, Cavalo Amarelo?
- Não.
- Vens anunciar a tua derrota?
- Não.
- Então, o que fazes aqui?
- Venho convocar-te.
- Convocar-me?!
- Sim.
- Para uma reunião?!
- Não, para um duelo.
Os homens soltaram uma gargalhada em uníssono, incluindo Rowdy Yates. O próprio Cavalo Amarelo esboçara um sorriso. A situação era caricata: já se sabe que os índios nada sabem de pistolas. Rowdy Yates mostrou-se curioso, perguntou genuinamente:
- Queres morrer, Cavalo Amarelo?
- Não.
- Pensas que ganharás um duelo contra mim?
- Sim.
- A sério?
- A sério.
- Muito bem. E para quando queres marcar este duelo?
- Para agora.
O Cavalo Amarelo não espera um segundo. Saca uma caçadeira não se sabe de onde e dispara uma só vez. Depois foge no seu cavalo amarelo. Os homens demoram a reagir, ficam a olhar para o chão, onde jaz Rowdy Yates, de cabeça escancarada, indubitavelmente morto. Não dizem nada.
O xerife cessante sai de cena, retoma as funções. Alguns homens tiram o chapéu. Não era digno morrer daquela maneira, sem pré-aviso e pelas mãos de um índio.
Mas no Far West era assim, morria-se por tudo e por nada. A dignidade era tão longínqua como o resto da terra.
O mesmo sucedia, por exemplo, em Vila Real.